segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Namorados, chá e Iogurte

" ... Namorados. São uma coisa bestial. Dão-nos rosas, escrevem-nos poemas, compram-nos cartões com ursos remelosos e 'fofinhos' da colecção Forever Friends, olham para nós com aquela expressão de stray puppie que têm os cães da União Zoólica e enchem-nos os dias de amor e romance. Os mais dotados e dedicados trazem-nos o pequeno-almoço à cama, cantam-nos "You're everything", do Michael Bubblé, ao ouvido, levam-nos a Paris, oferecem-nos livros maravilhosos e discos inesquecíveis.Os mais tradicionais gostam de nos convidar para jantar nos restaurantes da moda, os artísticos preferem levar-nos ao teatro, ou a Porto Brandão numa romântica viagem de cacilheiro ao fim-de-semana com as gaivotas por companhia e meia dúzia de gatos-pingados avulsos no mundo. Namorados. São uma coisa bestial. Fazem-nos sentir que somos a mulher mais bonita, a Única, a Amada, a Desejada, uma espécie de versão contemporânea e feliz do D.Sebastião em feminino, na qual a armadura é trocada por um bom corpete com cinto de ligas. Chamam-nos pequenina, princesa, boneca e outras delícias para o ouvido e o coração, enchem-se de paciência para ouvir os nossos desabafos e alinham com os nossos amigos. Alguns até têm um dom especial para lidar com as nossas mães, mas isso é uma singularidade rara, não podemos contar com ela no comum mortal. Namorados. São uma coisa bestial. Até ao dia. Ao dia em que acordam e ficam com dúvidas, acendem a luz de alarme do complicómetro e começam a pensar no-que-é-que-isto-vai-dar, ou então ligam o radar, que é outra peça que vem sempre acoplada ao macho, e descobrem que o mundo está a abarrotar de Princesas, Pequeninas, e outros seres maravilhosos com longas pestanas, calças de ganga justas e cabelo comprido. E que muitas delas, coitadinhas, estão tão sozinhas, mesmo a precisar de companhia. Como dizia Michelet- sei que repito esta citação sem pudor, mas para mim é daquelas que dão para quase tudo, como o puré de batata nos menus dos colégios-, o homem caça e luta, a mulher intriga e sonha. E caça mesmo. Perdizes, Marcejas, galinholas, Cláudias, Kátias ou Luísas, tanto faz. De madrugada, no couto de um tio rico ou na pista do Lux, não é relevante. Não acho bem nem mal, acho que o homem é um ser predador e quanto a isso não há volta a dar, a não ser dar a volta por cima com elegância e poucas conversas. Caçar está-lhe no sangue, o homem gosta do acto em si, um safari no Quénia ou uma saída na movida lisboeta, tanto faz. O objectivo é apanhar uma presa e dar-lhe cabo do canastro. O que é preciso, é um tipo manter-se vivo, dizia-me no outro dia um caçador nato. Vivo e parvo, pensei eu, mas não lhe disse, porque não era o meu género, nem sequer valia a pena gastar o meu latim. Namorados. São uma coisa bestial, se nunca nos esquecermos que são como os iogurtes: saborosos, docinhos, deliciosos, mas com prazo de validade. Mas há que olhar para o lado bom da coisa e fazer como diziam os romanos: carpe diem, que é como quem diz, aproveitar o dia e esperar pelo dia seguinte sem esperar por nada. Seguir a velha regra que dita 'Rei morto, rei posto', olhar em frente e ter algum cuidado na aprovação do candidato seguinte. É que felizmente nem todos são caçadores, também existem os pescadores, aqueles que se sabem pôr a jeito com paciência e generosidade e que preferem cultivar o seu jardim do que andar a marcar território em terras alheias. Esses não são do tipo iogurte, são do tipo chá, com capacidade para durar uma vida inteira. "

Margarida Rebelo Pinto, In LuxWoman

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